terça-feira, 15 de setembro de 2009

Um repórter, por acaso, na Rocinha

Quinta-feira, 14 de setembro de 2008. Faltavam quinze minutos para o meio-dia, e eu estava na zona sul do Rio de Janeiro, mais precisamente em Botafogo, em frente ao morro Dona Marta. Entre uma árvore e um prédio, olhava - pela primeira vez - o Cristo Redentor mais de perto. Estava ali para fazer apurar uma pauta, e precisava pegar o ônibus 174 (o mesmo da tragédia no Jardim Botânico). Depois de quase uma hora, um jornaleiro me explicou o motivo de tanto atraso. “Esse ônibus agora é a 158, depois ‘daquilo’, a linha foi trocada”, disse.



Ao entrar no ônibus, comecei a observar o que ocorria dentro e fora dele. A presença da polícia nas ruas, principalmente próximo aos colégios particulares, impressionava-me. Com menos de 15 minutos de viagem, um garoto sentou ao meu lado. Logo, começou a xingar o motorista, tornando a minha reação inevitável: “Rapaz, qual é o motivo de tanta raiva?”, perguntei. O menino, de 12 anos, começou então a narrar como era o seu dia, principalmente dentro do ônibus.


Depois de entender parcialmente a história, perguntei onde ele morava. “Rocinha”, respondeu, de maneira ríspida. Eu, que nunca estive em uma favela, não poderia perder a oportunidade e me convidei para almoçar em sua casa. O garoto não sabia se haveria comida. Respondi que não tinha problema. Ele, sem acreditar que alguém estava tão ansioso para conhecer sua casa, alertou-me: “Vê se não encara ninguém lá, é regra”, aconselhou. E eu obedeci, óbvio. Regra é regra, e tem que ser cumprida (principalmente dentro de uma favela).


Estávamos no ponto final, na Gávea, na entrada da Rocinha. Perguntei à cobradora se havia algum problema em subir. “Claro que não. cara. Vai tranquilo, só tem gente boa aí!”, sorriu Gláucia dos Santos, 26 anos. Respirei fundo, sequei o suor do rosto e fui com o garoto. As cenas de Tropa de Elite (que mesmo antes de ser lançado, foi pirateado e que dias antes eu havia assistido) não saiam da minha cabeça. Lembrei de Tim Lopes e de tantas outras pessoas mortas no famoso “micro-ondas”, no alto da favela.


O menino morava logo no início da primeira ladeira, dentre alguns becos. Cheguei ainda com certo medo e me apresentei à mãe dele como um amigo, alguém que tinha curiosidade de conhecer a favela. Naquele instante eu já sabia que morador nenhum podia conversar com a imprensa, pois correria o risco de ser tratado como “X-9”. E não era a minha intenção colocar aquela humilde família em risco.


A mãe do menino me recebeu muito bem, desculpou-se por não ter nada a oferecer. E eu quase que me desculpei também, por não ter nada a oferecer a ela, seus seis filhos e sua avó, que era cega. Em alguns minutos, quando a conversa já fluía de maneira empática, uma vizinha chamou dona Helena, mãe do menino, e a perguntoua ao pé-do-ouvido se eu era assistente social. Dona Helena negou. Eu fiquei tranquilo em saber que não parecia com um policial. Afinal, antes de entrar na favela brinquei com o menino que eu poderia ser um policial disfarçado. Ele friamente respondeu: “Nem ligo, você que vai morrer mesmo”.


Conversei quase uma hora com aquela família de maneira antropológica. O menino falou do sonho de ganhar uma camisa de marca famosa – e que fosse verdadeira. Disse-me também que queria ser alguém na vida; sendo questionado por mim: “Mas você já não é?”. Depois de um sorriso tímido, a resposta: “Sou… Mas quero ser mais!”, exclamou o garoto.


Dei um abraço no menino e um adeus para todos. O garoto me acompanhou até o ponto do ônibus. Prometeu que jamais fazer nada de errado e que daria orgulho a sua mãe, sendo um cidadão honesto. Antes da promessa, tive que explicá-lo brevemente o que era a cidadania. Voltei sem a reportagem inicial, mas com uma bagagem imensa. A culpa também desceu comigo, já que me senti um inútil em não poder fazer muita coisa para que crianças como aquela tenham a oportunidade de cumprirem as promessas de serem pessoas diferentes do que todos imaginam que elas serão um dia.

terça-feira, 8 de setembro de 2009

Favela em debate

Nesta quarta-feira (9/9), às 18h, no auditório do 10º andar da Universidade Candido Mendes, em Niterói, será exibido o documentário "Abaixando a máquina - ética e dor no fotojornalismo carioca". Em seguida, haverá um debate sobre "A cobertura jornalística nas favelas cariocas".

Estarão presentes:

- Camilo Coelho, repórter do EXTRA
- Domingos Peixoto, fotógrafo do GLOBO
- Guillermo Planel, documentarista, diretor de "Abaixando a Máquina"
- Ocimar Santos, diretor do site Rocinha.Org
- Rafael Coelho, redator da agência Palavra-Chave e autor do blog Favela Impressa

Compareça!

terça-feira, 1 de setembro de 2009

Introdução ao tema: como os moradores da Rocinha se veem nos jornais Extra e O Globo

Quando Kant elaborou um princípio moral universal, ele se absteve da prescrição de ações ideais para situações mais especificas. O jornalista que atua na cobertura da favela esbarra em inúmeros dilemas éticos, que sempre conflitam com o compromisso social que acredita ter.

Seu dia a dia é pautado por um editor, que é subordinado a uma hierarquia que, por sua vez, defende seus interesses enquanto empresa de comunicação – tarefa nada fácil para um profissional que, durante o curso de jornalismo, achou que seria independente ao reportar as informações apuradas para o leitor.

O principal insumo do jornalista é o ser humano. No caso do profissional que cobre a favela, geralmente sua área de atuação é restrita a um poder paralelo ao Estado. Além disso, quem sobe a favela para cobrir um fato tem uma opinião formada sobre aquele lugar e lida com várias questões, como o livre arbítrio e a liberdade de expressão – ambas nem sempre respeitadas nesses locais.

Outro dilema é a realidade dos moradores, que muitas vezes são impedidos de testemunharem contra as barbáries com as quais convivem. É neste cenário que o repórter precisa caminhar para trazer ao conhecimento da sociedade o que acontece em um de seus setores. Então, eis uma das questões mais complexas que envolvem a favela: até onde ela é vista e reconhecida como parte integrante da sociedade? Deste questionamento, surge outro mais complexo: como os moradores da favela se veem na imprensa?

A partir desta dúvida, chega-se a um campo ainda mais específico: a favela da Rocinha. Embora esteja sempre na mídia e seja envolta de certo glamour, a comunidade recebe o mesmo estereótipo das demais favelas: o da violência. É raro haver uma cobertura que fuja deste assunto. A ideia que se tem é que o cotidiano da favela se baseia em drogas, morte e sangue.

Apesar de muita gente “usar” a Rocinha como objeto (político, religioso, de pesquisa, midiático ou jornalístico), ela tem a sua própria história e também a sua própria realidade – que não podem ser conhecidas somente pelas páginas dos jornais. Diante desta situação, torna-se necessário fazer um retorno ao surgimento das favelas cariocas, mais precisamente em 1893, para que seja feita uma análise da cobertura dos jornais impressos da época.

Compreendido como a imprensa se posicionava em relação às favelas, discorre-se sobre o conceito de espaço ou território, já que os moradores da favela sempre foram tachados de invasores – além de representarem risco à saúde e à segurança pública. Outra questão analisada é o termo utilizado para denominar quem mora em uma favela (morador ou favelado?).

Para seguir com o tema, é preciso fazer uma análise da cobertura dos principais jornais cariocas sob a ótica jornalística. Reportagens de diversos jornais cariocas necessitam ser comentadas para que se levantem questões críticas e assertivas cometidas pelos mesmos. Além disso, mostra-se o alarde com o qual a imprensa trata a notícia quando é ela quem assume o papel de vítima.

No fim, chega-se à tarefa – talvez – mais importante deste trabalho: a voz dos moradores da Rocinha. Por meio de demonstração de dez reportagens (cinco do Extra, cinco do Globo), os moradores expõem suas sensações em relação ao que leram. Feito isso, chega-se então à reposta inerente ao tema.


Continua em breve: um pouco sobre a história das favelas.

domingo, 2 de agosto de 2009

Entrevista com Carlos Costa, diretor do jornal “Rocinha Noticiais”

Rafael: Como o morador da favela convive com o estigma do local em que vive?

Carlos: Cada caso é um caso. Estigma é algo que atinge a todos de um modo geral. Entretanto, cada pessoa reage de uma forma. A maioria, inclusive, incorpora os estigmas e passa a acreditar, ainda que não verbalize abertamente, que realmente é responsável enquanto morador destas regiões pelas conturbações sociais, marginalidades e crescimento da violência em nosso estado. Há porém, um número considerável de pessoas que no dia a dia trabalham para desconstruir estes conceitos. Mais do que isso: solidificam ações afirmativas no desejo de revertaer esse abominável senso comum.

Rafael: Você acredita que a imprensa contribui com o esteriótipo que a favela vem recebendo desde o seu surgimento (perigoso, anti-higiênico etc.)?

Carlos: Involuntáriamente, sim. Entretanto, é importante ressaltar iniciativas da própria mídia como um todo (ABI, Sindicatos de Profissionais, mídia alternativas e outros) que têm se aproximado bastante destes espaços e contribuído para levar ao conhecimento públicos "outras histórias e notícias", fugindo da cobertura romantica e sem desmentir a presença das mazelas sociais tão comuns na cidade inteira, mas que nas favelas ganham contornos mais dramáticos.

Rafael: O que a imprensa não faz pela favela, mas que poderia fazer?

Carlos: Não sei o que "ela não faz", mas acho que ela poderia incentivar o jornalismo interativo, qualificar as fontes para se tornarem bases de consultas e, com isso, desenvolvendo a geração de notícias, fatos e casos da favela. Aproximar o leitor, ouvinte, telespectador do protagonismo de quem faz a notícia, cooptar a vaidade da juventude como ferramenta geradoura de notícias, tranformando essa estratégia em elemento principal e valorizado dentro destes territórios.

Rafael: O que ela faz que não precisaria (ou não deveria) ser feito?

Carlos: Destacar determinados perfis de "antagonistas sociais", perfis de criminosos bárbaros ou as excentricidades de suas atitudes criminosas. Espetacularizar determinados casos de violência (assalto à Bancos com resgate de Caixas Eletrônicos, por mais de 50 homens, Assalto ou fugas bem sucedido através de túneis, etc.).

Rafael: Qual é a diferença do jornal Rocinha Notícias para a grande imprensa?

Carlos: São diferenças extremas. Primeiro, o RN é um jornal local, de âmbito micro, enquanto a grande mídia cobre toda a cidade. Depois, a "liberdade de imprensa" tão protelada é garantida (na mídia local), desde que se tenha bom senso e cautela. A mídia comunitária é menos de denúncias e mais de comunicados, informações e utilidade pública. A relação veículo-leitores é de muita proximidade e, portanto, sujeita a permanentes conflitos ideológicos e de opiniãoes.

terça-feira, 21 de julho de 2009

Entrevista com Taís Mendes, repórter da editoria Rio, do jornal O Globo

Rafael: Os moradores da favela acreditam que a imprensa cumpre o seu papel de denunciar as mazelas que acontecem nas comunidades. Por outro lado, eles reclamam que os jornalistas só aparecem na comunidade para cobrir as mazelas do local. Você acredita que os jornais impressos poderiam fazer mais pelas favelas?

Taís: Acho que tanto os jornais quanto as televisões poderiam dar mais espaço para os bons projetos desenvolvidos em comunidades. Eu, particularmente, gosto muito do tema e, nos quase quatro anos de Globo Barra, quase me tornei setorista da Rocinha e do Vidigal. Naquele tempo, o Jornal de Bairros investiam muito nas comunidades (acho que ainda consegue). Com o tempo e a crescente violência, ficou difícil entrar nas favelas.

A visão deles é perfeita: de fato, nós vamos muito mais para cobrir operações policiais do que coisas boas. Eu sempre tento. Recentemente, fiz uma matéria sobre um grupo de moderadores que criou os coordenadores de trânsito. Na ausência do poder público, eles ajudam na travessia e a ordenar o trânsito caótico da Estrada da Gávea. Mas, para isso, é necessário sempre uma negociação com a associação de moradores. A presença da imprensa incomoda o tráfico. Você percebe.

Quando a polícia já ocupou o morro mesmo, não há o que fazer e a circulação da imprensa é mais tranquila. Mesmo assim, muitas vezes somos ameaçados por eles via rádio. Mas, apesar das dificuldades, acho sim que os jornais poderiam dar mais espaço para os bons exemplos nas favelas.


Rafael: Quais são as maiores dificuldades que os jornalistas encontram na cobertura policial na favela?

Taís: A maior dificuldade (e desafio) é ficar vivo. Não levar um tiro. Não ficar no lugar errado. Manter distância e, após o fim da operação, tentar obter o maior número de informações com a comunidade e os policiais. Alguns "coleguinhas", disfarçados de polícia (e com o ok da polícia, o que é pior), acompanham as operações com eles. Vão até nos carros da polícia, colocando em risco não só ele como também toda a imprensa.

Além disso, no dia seguinte, quando vc abre os jornais, não vê nada de diferente na matéria desse "coleguinha". Na hora do tiroteio, no meio dos policiais, vc não apura nada, não fotografa, só se defende. Um risco, na minha avaliação, desnecessário e irresponsável. Imprensa tem que entrar nas favelas vestida de imprensa, nos carros de reportagem.

terça-feira, 14 de julho de 2009

Entrevista: Mario Sergio Brum, mestre e doutorando em História

Rafael: Até que ponto o termo favelado não soa como algo pejorativo?

Mario Sergio: Embora, em certos períodos da história, alguns moradores de favelas quiseram passar um conotação positiva ao termo, como nos caso da União dos Trabalhadores Favelados, o termo favelado é pejorativo. Ele é uma "descrição" de um tipo de comportamento que seria estranho à cidade, seja a origem rural, étnica, hábitos higiênicos, ou comportamento criminosos. O termo é uma acusação de alguém que não deveria fazer parte da cidade, portanto, está fora de lugar. Tanto que às vezes é usado até como forma de diferenciação interna dentro da favela.


Rafael: Ocorre algum conflito entre a identidade do favelado e o sinônimo que este termo ganhou na sociedade?

Mario Sergio: É uma categoria construída pela sociedade e também pelos que dela fariam parte. Historicamente, o termo assume significados diferentes. Como falei acima, existiram aqueles que querem passar um conotação positiva ao termo e os que o utilizam de forma acusatória. É uma categoria em disputa sobre o seu significado. Por exemplo, esta identidade é formada tanto pelos moradores, que se identificam com a sua comunidade quanto pelos demais agentes, como Estado, Imprensa, etc. è uma via de mão dupla entre os moradores, que percebem características comuns entre si (o fato de morarem num mesmo local, de sofrerem discriminação por isso) e o conjunto da sociedade, que atrivbuem a um grupo esta identidade.

Rafael: Qual é o mapeamento histórico que pode ser feito até que se chegue ao atual significado do termo favelado?

Mario Sergio: Fiz isso na minha dissertação de mestrado, no capítulo 2 (veja aqui). É um apanhado de toda esta discussão.

Rafael: Fale um pouco sobre a imagem do favelado enquanto morador de uma comunidade carente.

Mario Sergio: É difícil aplicar este termo comunidade carente, pois a pobreza urbana não se restringe às favelas e em muita destas já há uma infra-estrutura de serviços às vezes até superior às médias da cidade, por isso este termo não me parece muito correto, e muitas lideranças comunitárias o criticam.

sábado, 11 de julho de 2009

Entrevista: Jailson de Souza, geógrafo, coordenador geral do Observatório das Favelas

Rafael: Você acredita que a imprensa faz uma cobertura deturpada em relação à favela?

Jailson: As visões de mundo apresentadas pela mídia hegemônica em relação aos espaços populares partem de um senso comum já estabelecido e se limitam a tratar das temáticas de violência e criminalidade. A naturalização da violência dentro dessas localidades faz parte de um processo de hegemonia que se utiliza de formas de convencimento e de formação, de um processo de comunicação e de difusão de visões de mundo das classes e grupos de poder dominantes a diferentes grupos sociais.

Esses discursos hegemônicos sustentam uma visão de distância entre as favelas e periferias dos espaços ditos formais, como se a favela não integrasse o espaço da cidade Além disso, estabelecem ainda uma tensão entre esses dois espaços na cidade via reprodução de intervenções que atingem os espaços populares sem contribuir para a mudança desse cenário caracterizado pela discriminação dos moradores dessas localidades e da segmentação dos espaços urbanos. Há, nesse sentido, uma restrição dos espaços de encontro e convívio na cidade, além de mecanismos que impossibilitam a participação desses moradores na vida urbana em sua plenitude, dificultando o exercício da cidadania.

Essa visão de mundo estigmatizante se pauta também pelo discurso criminalizante desses espaços. Esse discurso apresenta as favelas e periferias como o espaço onde estão os bandidos da cidade. Em entrevista ao site de notícias G1 , em outubro de 2007, o governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral disse que as favelas são fábricas de marginais , propondo a legalização do aborto como medida contra a violência no Rio. Essa lógica de associar o aborto como instrumento de redução da taxa de criminalidade na medida em que impede o nascimento de crianças indesejadas e criadas em famílias desestruturadas é absurdo.

Mas esse tipo de declaração é visto de forma natural pelos leitores dos grandes jornais cariocas e do país. Para eles, é mesmo na favela onde nascem e moram os bandidos das cidades. Esta visão também não é recente, desde o início do século XX, a mídia e o poder público apresentavam os cortiços e favelas como o foco da criminalidade. Essa visão, já arraigada pelo senso comum, contribui decisivamente para que as favelas e seus moradores se sintam distantes da cidade. Esses fatos foram naturalizados porque o discurso hegemônico apresenta as favelas como culpadas pela violência urbana, influenciada também pela presença de grupos criminosos armados – mais especificamente os traficantes de drogas e as milícias – dentro desses espaços, com o grande destaque que recebem nos noticiários.

Esse discurso criminalizante surge como justificativa a uma ordem social imposta pelos setores dominantes às favelas e de um conjunto de ações promovidas pelo poder público, na conformação de um espaço cada vez mais destituído do sentido de urbanidade. Essa visão coloca em voga a questão da cidadania para os moradores de favelas e periferias.

Com isso, precisamos pensar em rotas alternativas de comunicação que sejam capazes de apresentar uma nova visão desses locais que seja capaz de abranger toda a sua diversidade e diferenças, sem que para isso seja necessário deixar de lado os problemas vividos dentro dessas localidades. Convém lembrar que não desejamos de forma alguma idealizar as favelas e seus moradores. Pelo contrário, é necessário reconhecer que as favelas não estão colocadas como o espaço ideal de vivência e moradia para a população, já que é fruto das desigualdades sociais existentes em nossa sociedade.

Rafael: E qual seria o motivo que leva à imprensa a fazer este tipo de cobertura?

Jailson: Já no início do século XX os moradores de favelas eram considerados a “classe perigosa”, e a favela era definida como um verdadeiro “inferno social”. Nessa perspectiva, a favela é vista como externa à cidade, ao território reconhecido como o lugar, por excelência, de exercício da cidadania.

Essa diferenciação também ocorre nos casos de violência. Para exemplificar, podemos relatar diversos casos da cobertura da mídia e dos órgãos de segurança em relação à violência sofrida por um morador de periferia ou por um integrante das classes média e alta. Em dezembro de 2008, Matheus Rodrigues, de oito anos, foi alvejado com um tiro na nuca, disparado por um policial, na porta de casa, na favela Baixa do Sapateiro, no conjunto de favelas da Maré. Diversas organizações de direitos humanos e a Comissão de Direitos Humanos da Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) foram ao local e divulgaram o acontecimento para a imprensa. No dia, o jornal RJTV, da Rede Globo, noticiou a morte da criança, mas dizendo que, de acordo com a polícia, houve troca de tiros entre grupos rivais de traficantes, e o tiro que atingiu Matheus havia sido disparado por traficantes. Na edição do dia seguinte, no jornal O Globo, apenas uma nota em página interna do jornal. Na mesma data estava para acontecer o julgamento dos policiais que mataram o garoto João Roberto, em ação policial no dia 6 de julho de 2008 , e o jornal estampava na capa foto do pai de João Roberto, pedindo que fosse feito justiça no caso da morte do filho.

Além da cobertura exaustiva após o assassinato e durante as investigações, o julgamento ocupou mais espaço e mais dias na imprensa, do que em relação ao garoto morto dentro da favela. Casos assim são, infelizmente, rotineiros para os moradores desses espaços. Não cabe aqui questionar a importância que deve ser dado ao crime cometido contra o garoto João Roberto, e também da punição para os responsáveis. O que está colocado é a importância dada a casos semelhantes, mas que acontecem em espaços diferentes. Um, no bairro da Tijuca, no Rio, e outro dentro do conjunto de favelas da Maré. O primeiro tem uma repercussão maior e o apoio da imprensa e da sociedade para a punição dos culpados. No caso de Matheus, assassinado dentro da favela, a repercussão é infinitamente menor, e não há qualquer mobilização da sociedade – a não ser dos moradores da favela – para a investigação do assassinato e punição dos culpados.

Em pesquisa realizada pelo Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CESeC) junto a jornalistas sobre a cobertura de violência, a maioria dos profissionais ouvidos reconhece que os seus veículos têm grande responsabilidade na caracterização dos territórios populares como espaços exclusivos da violência. Admitem ainda que a população dessas localidades raramente conta com a cobertura de assuntos não relacionados ao tráfico de drogas e à criminalidade. Essa constatação por parte dos próprios jornalistas pode ser um grande passo na busca por uma nova cobertura da mídia em relação aos espaços populares. Porém, alguns aspectos dificultam essa transformação. Um deles é a condição social dos jornalistas. A grande maioria pertence à classe média. Nesse sentido, trazem pouca experiência relacionada ao cotidiano dos moradores de favelas e periferias.

Em entrevista ao CESeC, o editor-adjunto no Rio de Janeiro do jornal O Globo, Jorge Antonio Barros, disse que a maior parte dos repórteres sob seu comando vivem em bairros considerados de classe média, e que não sabe de nenhum repórter que more em favela. Em pesquisa da revista Imprensa de 2001, sobre a presença de negros nas redações, de 230 veículos, apenas 85 tinham um jornalista negro.

Essa falta de tato para tratar de problemas alheios é percebida também pelos moradores, que muitas vezes se negam a receber jornalistas por conta de matérias veiculadas que denigrem a imagem da favela. São recorrentes os casos de jornalistas solicitando, via organizações que funcionam dentro de favelas, o acompanhamento para a produção de matérias. Em grande parte dos casos, os moradores se revoltam com o que foi publicado, e se colocam, numa próxima ocasião, contrários a conceder entrevistas. As organizações que fazem essa ponte também saem debilitadas quando a matéria apresenta um teor negativo desses espaços, mesmo quando a pauta, a princípio, não aparenta esse objetivo.

Um exemplo da distorção dos fatos pela mídia, e da incompreensão dos moradores do tratamento dispensado, pode ser demonstrado em matéria sobre a pré-estréia do filme “Maré, nossa história de amor”, que aconteceu dentro da favela Nova Holanda, no conjunto de favelas da Maré e veiculada em duas emissoras de televisão . Embora as emissoras tenham coberto o mesmo acontecimento, as duas matérias apresentam olhares extremamente opostos. Enquanto a matéria veiculada pela TV Brasil sobre a exibição do filme diz, em sua chamada de abertura, “Shakespeare tem algum coisa a ver com rap? Uma quadra de escola de samba na favela Nova Holanda foi escolhida para a pré-estréia do filme Maré, nossa história de amor”, o Jornal do SBT abria a matéria assim: “A história de Romeu e Julieta ganhou uma versão para o cinema, encenada numa das favelas mais perigosas do Rio de Janeiro. E foi na comunidade que aconteceu a pré-estréia de Maré, nossa história de amor, só que os traficantes tentaram estragar a festa”
Para piorar, o Jornal do SBT apresentava imagens de arquivo de tumulto e confronto entre policiais e traficantes em alguma favela carioca, sem citar que as imagens eram antigas, dando a entender, principalmente após a fala do âncora do jornal, de que “os traficantes tentaram estragar a festa”, que a confusão aconteceu no dia da pré-estréia, e também que o conflito tinha ligação direta com a exibição do vídeo. Na notícia, a reportagem diz: “foi esse cenário de ódio que inspirou Maré, nossa história de amor (...). Romeu e Julieta lutam para ficar juntos na favela partida pela violência (...). Hoje aconteceu a pré-éstréia, uma seção especial só para os moradores da comunidade. A nossa equipe tentou acompanhar, mas por falta de segurança não conseguiu entrar na favela, nunca a vida imitou tão bem a arte”.


Em nota enviada à emissora, o Observatório de Favelas disse:

“(...) em nenhum momento, ao contrário do que afirma o âncora Carlos Nascimento na cabeça da matéria, a sessão correu o risco de não se realizar por problemas de segurança. As posteriores imagens DE ARQUIVO, que abrem a matéria, mostrando confrontos na favela, sem nada que identificasse as cenas como de arquivo, reforçam a informação equivocada dada pelo âncora.
“Cerca de 400 pessoas assistiram ao filme na quadra da escola de samba Gato de Bonsucesso no dia 24, uma segunda-feira. Cem delas em pé. Havia crianças, jovens, adultos e idosos, um público variado, numa região onde não tem um só cinema. Depois da sessão, a diretora Lúcia Murat e atores debateram por mais de uma hora com a platéia, e o clima era de confraternização.
“Não houve nenhum incidente no dia da sessão que pudesse sugerir à sua equipe de reportagem que eles não estariam seguros na quadra do Gato. Registro que uma equipe da TV Brasil e uma de uma produtora independente circularam pela comunidade, filmaram o evento, entrevistaram na quadra atores, diretor e populares.”


Outro fator que influencia esse tipo de cobertura é a linha editorial dos jornais, que na maioria dos casos privilegia a cobertura de matérias em bairros nobres, onde estão concentrado seus leitores. Um diretor de sucursal no Rio de Janeiro de um grande jornal, que não se identifica na entrevista do CESeC – provavelmente pelo teor de sua fala – diz que “o pessoal na redação até brinca e diz assim: ‘Olha, matéria grande em favela longe, só acima de 12 mortos’. É meio cruel, mas é isso mesmo. Agora, se for na Rocinha [localizada em zona nobre do Rio], o jornal dá a maior importância do mundo”.

A cobertura da mídia sobre violência, segurança pública e criminalidade, em especial quando se trata de matérias e reportagens que envolvem favelas e periferias, apresenta uma forte dependência das informações policiais na maioria esmagadora das reportagens. Até poderia ser natural que a principal fonte de informações viesse das polícias Civil, Militar e Federal, já que são responsáveis pela repressão, registro e investigação de crimes e ações violentas. Porém o que se dá não é uma prevalência de informações das polícias, mas as forças de segurança são as únicas fontes das matérias na maioria dos casos de notícias relacionadas à temática da segurança e da criminalidade. Mais de 50% apresentam apenas uma pessoa ou instituição como origem dos dados ou informações, e na maior parte das vezes, esta fonte está ligada a um batalhão da Polícia Militar ou a uma delegacia da Polícia Civil. Essa predominância coloca como contraponto a ausência de outros importantes atores sociais que não têm voz nas páginas dos jornais. Além disso, a mais grave consequência é a impossibilidade de críticas da imprensa às ações das forças de segurança, já que dependem exclusivamente das fontes policiais.

Além disso, hoje há uma barreira invisível que impede muitas vezes que jornalistas entrem em favelas. Fica a pergunta se os repórteres limitam sua presença nas favelas ao acompanhamento de ações policiais por causa da hostilidade da população, ou se passaram a encontrar essa recepção hostil porque só entram na favela acompanhando as ações policiais. Essa sensação de insegurança nas favelas aumentou drasticamente em 2002, com o assassinato do jornalista Tim Lopes, da TV Globo, no conjunto de favelas do Alemão. Após a morte do jornalista, a grande maioria dos órgãos de imprensa não permite que seus jornalistas entrem em favelas, por avaliarem que não podem garantir a segurança nesses espaços. Essa barreira dificulta o acesso aos moradores, mas não justifica a ausência de uma cobertura mais completa dos espaços populares.

Não se trata aqui de se buscar que se omita os problemas de violência que existem nas favelas e periferias, mas de também dar destaque à pluralidade de experiências vividas pelos moradores dessas localidades. Para a diminuição da violência é necessário políticas de redução das desigualdades, criação de empregos e educação. Porém, enquanto os jornais continuarem enfatizando quase que exclusivamente os conflitos armados e as ocorrências policiais na cobertura dos espaços populares, eles acabam por valorizar ações bélicas para o problema da segurança, incentivando uma política baseada na violência e na criminalização da população pobre. Cria-se a idéia de isolar as favelas, como se elas não fizessem parte da cidade. Ao invés de integrá-las, procura-se neutralizá-las ou extirpá-las da visão das classes dominantes.

Rafael: A imprensa ajudou a formar os estereótipos que a favela ganhou (doença e violência) desde seu surgimento?

Jailson: A imprensa teve papel fundamental nessa construção dos estereótipos. Os primeiros estudos sobre a cena urbana e seus personagens populares no Rio de Janeiro voltaram seus olhares para o cortiço, considerado então o local da pobreza. Podemos dizer que o cortiço foi o precursor da favela, tanto em relação a sua estrutura física – barracos e habitações precárias do mesmo tipo identificado em seguida no Morro da Providência –, como no tratamento dispensado pelo poder público – o cortiço era definido “como um verdadeiro ‘inferno social’, como antro da vagabundagem e do crime”. Outra relação que aproxima os cortiços das favelas é a ligação direta feita por alguns autores entre as demolições dos cortiços do Centro da cidade e a ocupação ilegal dos morros no início do século XX.

Os cortiços, percebidos ainda como lugares propagadores de doenças e do vício, eram denunciados e condenados através do discurso médico e higienista, levando à adoção de medidas administrativas, como leis promulgadas para impedir a construção de novos cortiços . No final do século XIX foi destruído o principal cortiço do Rio de Janeiro, o Cabeça de Porco. No início do século XX, entre 1902 e 1906, o então prefeito do Rio de Janeiro, Pereira Passos, realiza uma reforma urbana, que teve o objetivo, entre outros, de “sanear e civilizar a cidade erradicando um sem-número de habitações populares”.

A favela passa, nas primeiras décadas do século XX, a ocupar o primeiro lugar nos debates sobre o futuro da cidade do Rio de Janeiro e do Brasil, tornando-se alvo do discurso de médicos higienistas que condenam as moradias insalubres e de discursos que apontam o meio como condicionador do comportamento humano, persistindo a percepção das camadas pobres como responsáveis pelo seu próprio destino e pelos males da cidade.

Esse novo pensamento que emerge sobre a favela do Rio de Janeiro remonta às descrições e imagens que nos foram deixadas por escritores, jornalistas e reformadores sociais do início do século XX, que permitiram a formação de um imaginário coletivo sobre as favelas e seus moradores, ao mesmo tempo que opunham favela e cidade.

A imagem matriz da favela já estava construída a partir do olhar do jornalista/observador. Assim, a favela passa a ser incorporada ao imaginário da cidade de forma estereotipada como “outra cidade” ou “terra sem lei”. Ia-se, com isso, legitimando perante a opinião pública a lógica dos grupos sociais hegemônicos de que a favela não fazia e não deveria fazer parte da cidade.
Em uma breve trajetória do surgimento das favelas até os dias atuais, é possível verificar que a imagem do senso comum em relação às favelas é de um espaço homogêneo, definido pelo que não teria: falta de infra-estrutura urbana (coleta de lixo, água, esgoto), falta de arruamento, um local sem ordem e sem leis. Toda a pluralidade encontrada nas favelas cariocas é ignorada.


Rafael: O que seria preciso para que a imprensa fizesse uma melhor cobertura das favelas cariocas?

Jailson: Mesmo com os problemas apresentados – redações elitizadas, linha editorial e dificuldade de acessos às favelas – é preciso pensar em alternativas para driblar esses obstáculos e praticar um jornalismo menos parcial, principalmente porque a favela é citada em 27% das matérias sobre segurança e criminalidade. As deficiências da cobertura da mídia sobre segurança e violência devem primeiramente ter uma nova orientação de olhar sobre as favelas.

Os jornalistas precisam compreender primeiramente que não existe uma favela, mas sim favelas, no plural. Não se pode comparar a Rocinha, uma favela alojada em um bairro da zona sul, onde vive a elite do Rio, com comunidades de periferia, como a Vila Kennedy. Os jornalistas, em geral, não registram a variedade de situações sociais, culturais e econômicas contidas nestes grupamentos. Eles, em geral, trabalham com o estereótipo do morador da favela, percebido como negro, analfabeto e miserável, nos termos dos moradores dos anos 50. Esta generalização não contempla a realidade. Moram nas favelas desde famílias muito pobres até outras com um padrão financeiro e cultural típicos dos setores médios.

Essa percepção homogeneizadora não permite, também, que se percebam as mudanças que tem ocorrido no perfil educacional dos moradores. A população de universitários na Maré é muito maior do que a dos traficantes de drogas, por exemplo. Mas 87% das reportagens sobre esta comunidade e as outras só enfatizam a violência e a criminalidade.

O melhor caminho para se alterar essa cobertura é a aproximação da mídia com as favelas, dando voz e visibilidade aos moradores, possibilitando a criação de novos canais de diálogo com essa população. A aproximação com associações de moradores e organizações que atuam nesses espaços talvez seja o caminho mais simples para a imprensa promover o papel de criar e enriquecer um debate democrático, exigindo a execução de políticas públicas e buscando retratar a sociedade de forma integral – e não apenas a parte que afeta os interesses econômicos. Em discussão com moradores de várias favelas sobre a cobertura da mídia, é comum em todos os lugares, reclamações de moradores sobre a forma que a imprensa retrata sua localidade. Eles alegam que seria interessante que a mídia abordasse outros assuntos, como história das comunidades, comportamento, valores e práticas locais, opções culturais. Porém, isso raramente vira notícia para a grande mídia.

Talvez a principal mudança seja o reconhecimento de que essa população é cidadã pelos jornalistas. Um exemplo de como a cidadania é negada a esses moradores na mídia, é a utilização do termo exclusão social, como se o cidadão pobre estivesse excluído da ordem social e dos seus direitos. Essa denominação retira do pobre a sua condição de cidadania, desvaloriza as suas estratégias cotidianas para se inserir e viver na cidade. As favelas e periferias são mostradas como espaços à margem da sociedade, geralmente colocados como territórios inimigos, controlados por traficantes, dominadas pelo conflito e alvos de intervenções bélicas por parte das polícias.

Rafael: Entre as suas atribuições, o "Observatório de Favelas" trabalha na elaboração de conceitos e informações que confrontem com as visões criminalizantes e homogeneizantes sobre os espaços populares. A imprensa tem sido parceira de vocês neste sentido, ou ela atrapalha mais do que ajuda?

Jailson: Numa avaliação da nossa relação com a grande mídia, o saldo é positivo. Mesmo sendo críticos a ela em vários momentos, reconhecemos a importância que a mídia tem de influenciar o conjunto da sociedade. Por isso não podemos abrir mão de divulgar nossas ações e de discutir junto a esses grupos os nossos posicionamentos. Essa relação é importante também para que, em momentos de críticas, possamos ser ouvidos por esses veículos, com a credibilidade que conquistamos durante nossa trajetória.

Como colocado, a mídia hegemônica tem interesses já bem definidos e pouco busca uma cobertura diferenciada desses espaços. O que buscamos fazer é uma tentativa de influenciar o debate dentre desses veículos com temas que consideramos fundamentais para o exercício da cidadania. Mas mais do que isso, o que precisamos é do estímulo à emergência de uma nova linguagem no campo da comunicação, protagonizada por moradores de comunidades populares, possibilitando oferecer novos olhares a respeito desses espaços e permitir que se avance na luta pela hegemonia no campo da representação da cidade, na qual esta seja vista, acima de tudo, como espaço da diferença, da solidariedade e do encontro plural.

Essa produção hoje deve ser pensada de forma que os grupos e classes sociais subalternas possam ser eles os formuladores das idéias. Diferente do que os modelos tradicionais já realizaram, que propunham uma caminho de ação para as comunidades pobres, quando estes últimos se limitavam a aceitar a intervenção vinda de fora, com interesses diferenciados e que não reconheciam a pluralidade e a diversidade dessas localidades, precisamos de uma relação de colaboração, e não de imposição, com a participação ativa dos moradores como objetivo fundamental para uma mídia realmente cidadã.

O fundamental é trazer o sujeito para o centro das ações desse grupo, como responsável pela produção e construção dessa mídia. Só assim é possível pensar em uma mídia realmente democrática desvinculada dos interesses da mídia hegemônica. Também não há aqui uma luta para definir qual cultura e quais idéias são as corretas, mas de demonstrar que nenhuma cultura é melhor do que outra, e que a originalidade de cada uma é o que nos possibilita perceber o que há de universal entre elas.